Muita gente ainda acredita que chamar uma mulher negra de “mulata” é um elogio. Mas a verdade é que o termo carrega uma longa história de racismo e desumanização no Brasil, e, por isso, não deve mais ser usado.
Origem e etimologia do termo
O uso da palavra “mulata” remonta ao século XVI, quando passou a ser aplicada aos filhos de pessoas negras e brancas. Sua raiz está no latim mulus, que significa “mula” – um animal híbrido, fruto da mistura de espécies, visto como algo impróprio ou sem lugar definido. A associação direta é clara: desumanizar, comparando pessoas a animais.
Existe também uma segunda teoria, que aponta para a origem árabe. O termo muwallad era usado para se referir a pessoas de origem mista, “árabes estrangeirizados” ou descendentes de pai árabe e mãe não árabe. Mesmo assim, no Brasil, a palavra foi apropriada de forma racista, marcada por estigmas e preconceitos.
A sexualização do corpo negro
Independentemente da etimologia, o termo ganhou, em nosso contexto, uma forte conotação pejorativa e sexualizada. A pesquisadora Angélica Ferrarez de Almeida, no artigo A mulata trágica: repensando a categoria mulata no Brasil (publicado no Portal Geledés), analisa como a figura da “mulata” foi construída culturalmente como um mito social.
Essa personagem foi romantizada como exótica, sensual e hiperssexualizada, especialmente no Carnaval. Pintores, literatos e a indústria cultural brasileira ajudaram a consolidar esse estereótipo, transformando mulheres negras em símbolos de fantasia, desejo e espetáculo. Mas isso nunca representou a realidade ou a humanidade dessas mulheres.
O peso atual da palavra
Nos dias de hoje, quando chamamos uma mulher negra de “mulata”, estamos reproduzindo um termo que historicamente a animalizou, exotizou e reduziu à condição de corpo. Por isso, muitas mulheres rejeitam firmemente essa classificação.
Um exemplo recente foi dado pela atriz Camila Pitanga. Durante uma participação no podcast Mano a Mano, apresentado por Mano Brown, ela foi chamada de “mulata”. De forma firme e consciente, respondeu: “Negra”. Sua fala foi um ato político, que reacendeu o debate sobre o poder das palavras e a importância da autodeclaração na construção identitária.